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Dúvida/exame de competência
Atenção: O texto abaixo representa a transcrição de Dúvida/exame de competência. Eventuais imagens serão suprimidas.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ 1ª VICE-PRESIDÊNCIA Autos nº. 0006164-57.2023.8.16.0194 Recurso: 0006164-57.2023.8.16.0194 Ap Classe Processual: Apelação Cível Assunto Principal: Indenização por Dano Moral Apelante(s): FACEBOOK SERVICOS ONLINE DO BRASIL LTDA Apelado(s): LUIZ VICTOR LOMBA DIGITAL UP - TECNOLOGIA EM SISTEMAS LTDA ADVEASY SOLUÇÕES PARA INTERNET LTDA EXAME DE COMPETÊNCIA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C DANOS MORAIS. PRETENSÃO PRINCIPAL RELACIONADA AO RESTABELECIMENTO DE PERFIL DO AUTOR EM REDE SOCIAL (“FACEBOOK”). CAUSA DE PEDIR E PEDIDOS FUNDADOS NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DA RÉ, COM IMPACTO DIRETO NO NEGÓCIO JURÍDICO. SUBSUNÇÃO AO ARTIGO 110, INCISO III, ALÍNEA ‘C’ DO RITJPR.Amoldam-se à especialização regimental em “ações relativas aos demais contratos de prestação de serviços, excluídos aqueles de competência da Quarta, Quinta, Sexta e Sétima Câmaras Cíveis, bem como os concernentes exclusivamente a responsabilidade civil” as demandas que têm por objeto o restabelecimento de contas vinculadas a redes sociais. Precedentes.EXAME DE COMPETÊNCIA ACOLHIDO. 1 - RELATÓRIO Trata-se de Exame de Competência no recurso de Apelação Cível nº 0006164- 57.2023.8.16.0194 Ap, interposto contra decisão proferida pelo Juízo da 21ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba, nos autos de “Ação de Obrigação de Fazer c/c Indenizatória por Danos Morais” nº 0006164-57.2023.8.16.0194, ajuizada por Adveasy Soluções para Internet Ltda.; Digital Up - Tecnologia em Sistemas Ltda e Luiz Victor Lomba em face de Facebook Serviços Online do Brasil Ltda. Na data de 25.10.2023, o recurso foi distribuído, por sorteio, como “ações e recursos alheios às áreas de especialização”, ao Desembargador Antônio Carlos Ribeiro Martins, na 20ª Câmara Cível (mov. 7.1 – TJPR). O eminente Magistrado, no dia 30.10.2023, declinou da competência com os propostos fundamentos: “(...) II. Conforme reiteradas decisões da 1ª Vice-Presidência desta Corte, a distribuição da competência entre as câmaras é determinada, em regra, conforme o pedido principal e a causa de pedir contidos na petição inicial. (...) Em resumo, o pedido principal da ação é de obrigação de fazer e a causa de pedir baseia-se na invasão do perfil dos autores no Facebook. Os fatos narrados e a causa de pedir, portanto, se baseiam em relação jurídica oriunda de contrato de prestação de serviços digitais, de forma que a distribuição do presente recurso deve ser feita de acordo com a especialização contida na alínea “c” do inc. III do art. 110 do RITJPR. Nesse sentido, confira-se ementa de julgado da 1ª Vice-Presidência: "EXAME DE COMPETÊNCIA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PEDIDO LIMINAR. PEDIDO PRINCIPAL RELACIONADO AO RESTABELECIMENTO DE CONTA NA REDE SOCIAL “INSTAGRAM”. RELAÇÃO JURÍDICA LITIGIOSA DERIVADA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DIGITAIS. INTELIGÊNCIA DO ART. 110, INCISO III, ALÍNEA “C”, DO REGIMENTO INTERNO DESTE TRIBUNAL. TEMPUS REGIT ACTUM. PRECEDENTES. EXAME DE COMPETÊNCIA NÃO ACOLHIDO." (0065785- 19.2022.8.16.0000 - Londrina - Rel.: DESEMBARGADOR LUIZ OSORIO MORAES PANZA - J. 16.12.2022) Não grifado. Portanto, conclui-se que a competência para julgamento do recurso é da 6ª e 7ª Câmaras Cíveis, observada a causa de pedir e os pedidos.”. (mov. 13.1 - TJPR) No mesmo dia o recurso foi redistribuído, pelo critério de especialização de “Ações relativas a prestação de serviço...”, ao em. Desembargador José Augusto Gomes Aniceto, integrante da 7ª Câmara Cível, (mov. 17.1 – TJPR). Posteriormente, em razão da sucessão, os saltos foram redistribuídos ao em. Desembargador Victor Martim Batschke (mov. 39.1 – TJPR). O novo relator, em atenção à regra do artigo 36, §3º do RITJPR, SEI nº 0057820- 61.2024.8.16.6000, devolveu os autos para designação de Desembargador Substituto. Na sequência, conclusos os autos ao em. Desembargador Substituto Evandro Portugal, o nobre magistrado declinou da competência, em 21.06.2023, sob os seguintes argumentos: “(...) Cumpre salientar, desde logo, que o presente recurso foi distribuído para esta 7ª Câmara Cível equivocadamente. Isto porque, o Regimento Interno deste Tribunal determina a distribuição dos recursos por matéria (art. 110) Para tanto, é necessário verificar o pedido e a causa de pedir da demanda para que se possa fazer a conferência com cada uma das especialidades previstas e, então, definir a Câmara competente para o processamento e julgamento. Neste sentido, conforme se vê: (...) A distribuição da competência entre as Câmaras do Tribunal de Justiça é determinada conforme o pedido principal e a causa de pedir contidos na peça inicial concernentes à matéria a ser decidida, ou seja, à área da ciência do Direito tal com instrumenta o ordenamento jurídico vigente (...) (TJPR, 11ª Câmara Cível, 0003766- 79.2019.8.16.0000, Toledo, Relator: Coimbra de Moura, Julgado em 19.02.2019) grifou-se No caso dos autos, a partir da análise da causa de pedir e dos pedidos formulados na petição inicial, verifica-se que a pretensão da parte autora é relativa à reponsabilidade civil, a qual é afeta à Oitava, Nona e Décima Câmara Cível: (...) Estas câmaras, inclusive, já julgaram feitos análogos em face da mesma empresa, os quais, inclusive, foram distribuídos a câmaras diversas que, da mesma forma, declararam sua incompetência. Veja-se: (...) Assim, dos pedidos principais e do contrato objeto dos autos, verifica-se que o assunto do presente recurso não guarda similitude com as “ações relativas a prestação de serviço ao usuário final de telefonia fixa, telefonia móvel, internet e tevê por assinatura, e os demais contratos de prestação de serviços, regulados pelos artigos 593 a 609 do Código Civil, excluídos aqueles de competência da Quarta e Quinta Câmaras Cíveis, bem como os concernentes exclusivamente a responsabilidade civil”, o que afasta a competência desta câmara. Deste modo, é de se determinar a redistribuição do feito, razão pela qual, devolvo os autos para que seja realizada a redistribuição, em observância ao disposto no artigo 110, inciso IV, inciso “a”, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça.”. (mov. 49.1 - TJPR) Em 24.06.2024, o recurso foi redistribuído por sorteio à em. Desembargadora Themis de Almeida Furquim, integrante da 8ª Câmara Cível, como “Ações relativas a responsabilidade civil...” (mov. 53.1 - TJPR). No mesmo dia, a il. Magistrada suscitou exame de competência com os seguintes argumentos: “(...) 1. Em que pese a respeitável decisão de mov. 49.1 – TJ, em que o ilustre Desembargador Substituto Evandro Portugal, da 7ª Câmara Cível deste egrégio Tribunal de Justiça determinou a redistribuição do recurso em razão de suposta atração de competência das Câmaras especializadas em ações relativas à responsabilidade civil, entendo que o fundamento utilizado para tanto não subsiste. 2. Como é de conhecimento, o exame da competência se dá à luz da causa de pedir e dos pedidos da petição inicial. No caso, a causa de pedir refere-se à má prestação do serviço oferecido pela parte ré, que não conseguiu solucionar o problema relatado pelo autor, relativo à perda de acesso a sua conta pessoal e consequente as contas de anúncio que estão a ela vinculadas. Segundo a exposição fática originária, o problema foi relatado a parte ré, porém a questão não foi solucionada extrajudicialmente, mesmo após 60 dias da ciência da ré. Conforme apontado na inicial, “Os Requerentes utilizam o serviço prestado pelo Requerido como plataforma digital de rede social para impulsionar o seu negócio. A plataforma fornecida pelo Requerido, qual seja, FACEBOOK, exige que uma conta de anúncio esteja vinculada a uma conta pessoal que servirá para administrar uma ou mais contas de anúncio”. Os pedidos iniciais pleiteiam a devolução do acesso às contas de anúncio e perfil pessoal, além da declaração de inexigibilidade de qualquer débito eventualmente existente e vinculado às contas hackeadas, desde a data em que o acesso foi perdido até a data da efetiva recuperação. Ainda, os danos morais decorrentes da “falha na prestação do serviço verificada em dois momentos distintos Há tópico específico, inclusive, para demonstrar a relação de consumo existente entre as partes, com expressa indicação de que “o Requerido é prestador de serviço, explorando o ramo de tecnologia através do fornecimento de plataforma virtual para anúncios com habitualidade e com finalidade de obter lucro, enquanto os Requerentes ocuparam a posição de consumidores que se cadastraram na plataforma para realizar anúncios usufruindo do serviço por ela prestado”. A sentença, ainda, consignou que “é incontroversa a falha na prestação de serviços, devido a requerida fornecer plataforma, que em casos de problemas dos seus usuários, deve prestar suporte para resolução. Se a plataforma de rede social decide ofertar serviços para anúncios, precisa garantir prestação de assistência efetiva”. Portanto, no caso a inicial não estampa em sua causa de pedir pedidos estritamente indenizatórios, estando diretamente vinculada ao cumprimento da prestação de serviço, restabelecimentos destes, bem como os prejuízos decorrentes das supostas falhas apontadas na inicial. Inclusive a tutela provisória de urgência foi requerida nos seguintes termos: “para que seja determinado ao Requerido que devolva o acesso às contas pessoal e de anúncio dos Requerentes, todas normalizadas e em perfeitas condições para o exercício da finalidade a que se destinam, sem qualquer restrição ou limitação de uso, resolvendo de uma vez por todas os chamados em aberto (i) JOB 162532929933176 e (ii) JOB 1538569943295879;” (mov. 1.1, fl. 16), deixando claro que a discussão não se restringe ao pedido indenizatório, mas o próprio restabelecimento do serviço discutido. Diante disso, verifica-se que para se aferir o dever ou não de indenizar, inquestionável a necessidade de analisar se houve ou não a falha nos serviços prestados pela ré e os desdobramentos daí decorrentes. Logo, não se tratando de ação concernente exclusivamente a responsabilidade civil, não se sustenta a distribuição realizada com base na alínea “a” do inciso IV, art. 110, do RITJPR, devendo ser redistribuído a uma das Câmaras competentes para análise das “c) ações relativas a prestação de serviço ao usuário final de telefonia fixa, telefonia móvel, internet e tevê por assinatura, e os demais contratos de prestação de serviços, regulados pelos artigos 593 a 609 do Código Civil” a saber, à Sexta e à Sétima Câmara Cível, conforme alínea “c”, do inciso III, art. 110, do Regimento Interno deste Tribunal. Em caso idêntico, inclusive, assim decidiu a 1ª Vice-Presidência: “EXAME DE COMPETÊNCIA. AGRAVO DE INSTRUMENTO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C DANOS MORAIS. PRETENSÃO PRINCIPAL RELACIONADA AO RESTABELECIMENTO DA PÁGINA DA AUTORA NO “FACEBOOK”. CAUSA DE PEDIR E PEDIR FUNDADOS NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DA RÉ, COM IMPACTO DIRETO NO NEGÓCIO JURÍDICO. SUBSUNÇÃO AO ARTIGO 110, INCISO III, ALÍNEA ‘C’ DO RITJPR. Amoldam-se à especialização regimental em “ações relativas aos demais contratos de prestação de serviços, excluídos aqueles de competência da Quarta, Quinta, Sexta e Sétima Câmaras Cíveis, bem como os concernentes exclusivamente a responsabilidade civil” as demandas que têm por objeto o restabelecimento de contas vinculadas a redes sociais. Precedentes. EXAME DE COMPETÊNCIA NÃO ACOLHIDO. (TJPR - 1ª Vice-Presidência - 0091597- 29.2023.8.16.0000 - Londrina - Rel.: JOECI MACHADO CAMARGO 1 VICE - J. 04.12.2023 - destaquei) 3. Em face do exposto, por discordar da redistribuição realizada a esta magistrada, formulo consulta à 1ª Vice-Presidência, nos termos do artigo 179, § 3º, do RITJPR, a fim de que proceda à decisão quanto ao julgador competente para o conhecimento e julgamento desta demanda.”. (mov. 59.1 - TJPR) A seguir, os autos vieram conclusos a esta 1ª Vice-Presidência para definição da competência recursal. (mov. 61.1 - TJPR) É o relatório. 2 - FUNDAMENTAÇÃO A distribuição da competência entre as Câmaras do Tribunal de Justiça é determinada conforme o pedido principal e a causa de pedir contidos na peça inicial[i]. Por força de exceções expressamente contempladas no Regimento Interno desta Corte, ademais, podem influir na definição da competência a natureza da ação (por exemplo, ser ela de conhecimento ou de execução), além da qualidade de uma das partes (ser ela pessoa jurídica de direito privado ou público). Por fim, havendo conexão ou continência entre ações onde de ordinário a competência para o julgamento de recursos seja confiada a Câmaras distintas, a prevenção poderá servir de critério determinante para que saiba a qual delas competirá o julgamento dos feitos reunidos. Sobre a causa de pedir e o pedido explica José Rogério Cruz e Tucci: “(...) acompanhando a evolução da ciência processual, causa petendi é a locução que indica o fato ou o conjunto de fatos que serve para fundamentar a pretensão processual do demandante: ex facto orius ius – o fato gera o direito e impõe um juízo. (...) Observa-se, nessa linha de raciocínio, que o fato ou os fatos que são essenciais para configurar o objeto do processo, e que constituem a causa de pedir, são exclusivamente aqueles que têm o condão de delimitar a pretensão. (...) Conclui-se, assim, que a causa petendi possui dupla finalidade advinda dos fatos que a integram, vale dizer, presta-se, em última análise, a individualizar a demanda e, por via de consequência, para identificar o pedido, inclusive quanto à possibilidade deste. (...) Deve-se entender o termo pedido não em seu sentido estrito de mérito, mas sim conjugado com a causa de pedir”.[ii] Pois bem. A ação originária trata de “Ação de Obrigação de Fazer c/c Indenizatória por Danos Morais” nº 0006164-57.2023.8.16.0194, ajuizada por Adveasy Soluções para Internet Ltda.; Digital Up - Tecnologia em Sistemas Ltda. e Luiz Victor Lomba em face de Facebook Serviços Online do Brasil Ltda. Inicialmente, narram os autores que são proprietários de contas junto à rede social Facebook – sendo que Luiz Victor utiliza a sua conta pessoal para administrar diversas contas de anúncio, dentre elas, as da segunda e terceira requerentes (Digital Up e Adveasy). Aduzem que que nas datas de 05.03.2023 e 21.03.2023 Luiz teve seu perfil na referida rede social invadido por hackers. Diante do ocorrido, realizou dois chamados administrativos à empresa mantenedora da rede social para a resolução deste tipo de situação e recuperação das contas hackeadas, sob números de protocolo JOB 162532929933176 e JOB 1538569943295879. Relatam, então, que apesar de recuperar temporariamente o acesso à conta pessoal de Luiz, as contas de anúncio das demais requerentes já haviam sido transferidas para outro perfil alegadamente administrado pelos hackers. Aduzem que na data de 16.03.2023 houve a recuperação de apenas uma das contas citadas; salientam, ainda, que “havia um crédito de R$ 4.000,00 que não foi utilizado pela empresa para seus anúncios, mas pelo hacker para praticar atos fraudulentos”. Após relatar nova perda de acesso à sua conta, bem como a ausência de resposta satisfatória da requerida para seus pleitos sobre a questão, ingressou com a presente demanda visando, justamente, a recuperação do acesso às contas e, ainda, a indenização pelos danos morais sofridos. Os pedidos foram elencados da seguinte forma: “(...) b) A concessão da tutela provisória de urgência antecipada, para que seja determinado ao Requerido que devolva o acesso às contas pessoal e de anúncio dos Requerentes, todas normalizadas e em perfeitas condições para o exercício da finalidade a que se destinam, sem qualquer restrição ou limitação de uso, resolvendo de uma vez por todas os chamados em aberto (i) JOB 162532929933176 e (ii) JOB 1538569943295879; (...) e) Por fim, seja julgada TOTALMENTE PROCEDENTE a presente ação, para o fim de: (...) e.2) declarar a inexigibilidade de qualquer débito eventualmente existente e vinculado às contas hackeadas, desde a data em que o acesso foi perdido até a data da efetiva recuperação; e.3) Condenar a requerida ao pagamento de indenização a título de danos morais em favor dos Requerentes, em montante não inferior a R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para CADA um, de acordo com a jurisprudência do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Paraná; (...). ” (mov. 1.1 – origem) Importante observar que embora a distribuição inicial tenha ocorrido com base no artigo 111, inciso II, do RITJPR (“Ações e recursos alheios às áreas de especialização”), é assente o entendimento no âmbito da 1ª Vice-Presidência de que a relação jurídica que vincula o usuário e os provedores de plataformas de redes sociais (Facebook, in casu), é, efetivamente, a de contrato de prestação de serviços; isso porque os réus alienam aos usuários uma variedade de produtos para suas contas – o que lhe confere característica de prestadora/fornecedora de serviços, ao passo em que os seus contratantes assumem a qualidade de tomadores/consumidores dos serviços. No meu entender, tal vínculo se subsome ao conceito de prestação de serviços – classificado por Flávio Tartuce como “o negócio jurídico pelo qual alguém – o prestador – compromete-se a realizar uma determinada atividade com conteúdo lícito, no interesse de outrem – o tomador -, mediante certa e determinada remuneração”[iii]. Ainda quanto ao tópico, ressalto que não houve propriamente divergência entre os eminentes magistrados quanto à natureza da relação jurídica – delineada acima. A divergência resume-se, então, ao caráter exclusivamente indenizatório da pretensão indenizatória, o que resultaria na incidência do artigo 110, inciso IV, alínea “a”, do RITJPR. Para o deslinde do feito, retomo inicialmente a orientação sugerida noutros exames de competência julgados por esta 1ª Vice-Presidência, de que “quando a pretensão jurisdicional impactar diretamente o negócio jurídico, como no caso de resolução tácita ou expressa (por exemplo, ressarcimento dos valores pagos e retorno ao status quo ante), de revisão ou de cumprimento do contrato, ainda que cumulada com pedido indenizatório (responsabilidade civil contratual), a competência para o julgamento de recursos será determinada pela natureza do mesmo negócio”. Contudo, “caso a pretensão deduzida no processo envolva, exclusivamente, a discussão da responsabilidade civil contratual, limitando a análise do negócio jurídico à ocorrência do dano material ou moral indenizável, sem pretensão de seu cumprimento, revisão ou resolução, o feito deverá ser distribuído às Câmaras especializadas em responsabilidade civil, nos termos do art. 110, inciso IV, alínea “a”, do RITJPR”[iv]. Vejamos. Conforme relatado acima, verifica-se que o cerne da discussão, isto é, a causa petendi, reside na alegação do autor de que perdeu o acesso às suas contas na plataforma Facebook após invasão por hackers, além da falha na prestação de serviço pela ré para restabelecer os acessos. Ademais, nota-se que seus pedidos têm como intuito a condenação da requerida ao cumprimento de obrigação de fazer, consistente no restabelecimento da administração da conta pessoal e das contas de anúncios, com consequente indenização por danos morais; pede-se, ainda, o reconhecimento da inexigibilidade de valores atrelados a serviços contratados junto à ré (sob argumento de terem sido realizados por terceiros). É dizer, no caso ora em análise, a pretensão principal vertida pelo autor claramente excede a seara negocial pura, impactando no contrato – seja ao determinar o seu cumprimento adequado, seja ao reconhecer a exigibilidade, ou não, de valores cobrados em razão deste vínculo. Aliás, tal posicionamento já foi exarado em exame de competência anterior, concluindo-se que caso “a parte autora (contratante tomador de serviço) vise compelir a parte requerida (prestador de serviço), a manter o regular funcionamento de página em rede social, em tutela específica de cumprimento adequado do contrato, a distribuição deverá ocorrer na forma do art. 110, inciso V, alínea “d”, do RITJPR”[v]. Ressalto, ainda, os seguintes julgados da 1ª Vice-Presidência - em acréscimo àquele citado pela em. Desª Themis de Almeida Furquim (mov. 59): EXAME DE COMPETÊNCIA. AGRAVO DE INSTRUMENTO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CAUSA DE PEDIR LASTREADA NA ALEGADA FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS OFERTADOS PELA RÉ. PRETENSÃO DE RESTITUIÇÃO DO ACESSO DA CONTA DA AUTORA AO AMBIENTE VIRTUAL DE REDE SOCIAL (INSTAGRAM) E REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. SUBSUNÇÃO AO ARTIGO 110, INCISO III, ALÍNEA ‘C’. Amoldam-se à especialização regimental em “ações relativas aos demais contratos de prestação de serviços, excluídos aqueles de competência da Quarta, Quinta, Sexta e Sétima Câmaras Cíveis, bem como os concernentes exclusivamente a responsabilidade civil” as demandas que têm por objeto o restabelecimento de contas vinculadas a redes sociais. Precedentes. EXAME DE COMPETÊNCIA NÃO ACOLHIDO. (TJPR – 1ª Vice-Presidência – 0023330-05.2023.8.16.0000 – Rel.: Desª. JOECI MACHADO CAMARGO – J. 24/05/2023) “EXAME DE COMPETÊNCIA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. PEDIDO PRINCIPAL RELACIONADO AO RESTABELECIMENTO DE CONTA NA REDE SOCIAL “INSTAGRAM”, ALÉM DA RESPONSABILIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE CIVIL PURA. RELAÇÃO JURÍDICA LITIGIOSA DERIVADA DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DIGITAIS. INTELIGÊNCIA DO ART. 110, INCISO V, ANTIGA ALÍNEA “D”, DO REGIMENTO INTERNO DESTE TRIBUNAL. TEMPUS REGIT ACTUM. PRECEDENTES. (...). EXAME DE COMPETÊNCIA ACOLHIDO. (TJPR - 1ª Vice-Presidência - 0003796- 46.2021.8.16.0194 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR LUIZ OSORIO MORAES PANZA - J. 06.12.2022) Por todo o exposto, reiterando o respeito a entendimentos diversos, entendo que a melhor solução reside na ratificação da distribuição realizada ao eminente Desembargador Substituto Victor Martim Batschke, na 7ª Câmara Cível, nos termos do artigo 110, inciso III, alínea “c”, do RITJPR, observando-se a designação do em. Des. Substituto Evandro Portugal (mov. 47). 3 – DISPOSITIVO Diante do exposto, com fundamento no artigo 179, § 3º, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Paraná, determino o retorno do recurso à Secretaria Judiciária (Divisão de Distribuição), para a ratificação da distribuição realizada ao em. Des. Victor Martim Batschke, junto à 7ª Câmara Cível, observando-se a designação do em. Desembargador Substituto Evandro Portugal (mov. 47). Curitiba, data da assinatura digital. Desembargadora JOECI MACHADO CAMARGO 1ª Vice-Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná G1V-46.01 [i] É o que se observa do julgamento dos seguintes recursos: DCC n° 421.076-2/01 - Rel. Des. Airvaldo Stela Alves - Órgão Especial - DJ de 3-8-2007; DCC 1152984-7/01 - Rel.: Lauro Laertes de Oliveira - Unânime - J. 21.03.2014; DCC 862560-3/01 Rel.: Leonel Cunha - Unânime - J. 14.05.2012. [ii] Tucci, José Rogério Cruz e. A causa petendi no processo civil. 2ª. Ed. Ver. Atual e Amp. São Paulo: Revista RT, 2001 (Coleção Estudos de Direito de Processo Enrico Tullio Liebmann), v. 27, p. 24 e 159. [iii] TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil – Volume único. 7ª Edição. 2017. Editora Método. p. 809. [iv] TJPR - 1ª Vice-Presidência -0044583-20.2021.8.16.0000 - Pinhais - Rel.: DESEMBARGADOR LUIZ OSORIO MORAES PANZA - J. 09.08.2021 e TJPR - 1ª Vice-Presidência - 0019002-68.2019.8.16.0001 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR LUIZ OSORIO MORAES PANZA - J. 19.07.2021 [v] TJPR – 1ª Vice-Presidência – 0078443-38.2019.8.16.0014 – Des.Luiz Osório Moraes Panza – J. 02.06.2021.
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